No mês de julho, o Brasil comemora 30 anos de implementação da atual moeda, por meio do conhecido Plano Real. Motivos para celebrar o aniversário não faltam em virtude da importância e do que significou domesticar a inflação em patamares relativamente baixos e civilizados.
As gerações que nasceram a partir de 1990 de fato se tornaram felizardas em relação às anteriores, porque não vivenciaram o período de inflação alta. Tradicionalmente, o Brasil sempre apresentou economia inflacionária.
Depois de 1964, meio sem querer, o que era para ser solução constituiu-se em problema, com a criação da correção monetária. Esse mecanismo que visava a evitar perda do poder aquisitivo, na medida em que foi se expandindo para corrigir rendas, rendimentos e outras formas de ganho na economia nacional, tornou o processo inflacionário recidivo.
Ou seja, a correção monetária até corrigir plenamente salários, tarifas e outros preços relevantes da economia, foi criando a indexação, considerando que os agentes econômicos visaram a corrigir suas remunerações baseadas nesta correção para manter o poder aquisitivo.
Com o tempo, os agentes passaram a olhar o comportamento presente e passado da inflação para estabelecerem expectativas quanto à taxa de inflação futura, de forma a se prevenirem de perdas. Nesse processo, as tentativas de domar a inflação fracassaram e o nível anual de preços subiu, por exemplo, de 215,27% em 1984 para 2.477,15% em 1993, período marcado pela hiperinflação – uma inflação aguda, em que o descontrole sobre os preços se estabeleceu e as políticas públicas em curso não obtiveram resultado para derrubá-la. Pelo contrário, nesse cenário, os preços passaram a subir aceleradamente.
Ao longo de sua história, a economia nacional apresentou inflação, sendo que dos meados da década de 80 até 1994, a evolução de preços tornou-se mais violenta, registrando hiperinflação em alguns períodos.
Por exemplo, em 1980, a inflação atingiu 980,21%, como se os preços de janeiro, ao chegarem em dezembro, tivessem sido multiplicados por 10,80. Já em 1992, bateu 1.119,10%, significando que os preços subiram mais do que 12 vezes.
Para que o cenário de incertezas jogasse para longe as possibilidades de estabilidade inflacionária, por algum tempo o Brasil arriscou-se na implementação de tentativas heterodoxas. Os planos com conteúdo de congelamento de preços, câmbio, tarifas públicas e salários, após cada fracasso transformavam-se em meras tentativas.
Nenhum deles teve êxito permanente porque os diagnósticos da conjuntura erraram; pouco intencionavam modificar o excesso de demanda do setor público sobre a economia e tinham no congelamento o fôlego inicial e necessário para tentar dobrar a espinha dorsal da inflação, buscando eliminar os mecanismos de indexação. Em linhas gerais, assim foram os planos Cruzado (1986), Bresser (1987), Verão (1989), Collor I (1990) e Collor II (1991).
O mais contundente destas iniciativas fracassadas foi o Plano Collor I, de março de 1990, quando arrestou, sequestrou as diversas formas de poupança do sistema financeiro, produzindo encolhimento da economia na ordem de 4,3%, uma das maiores da história do país.
O Plano Real veio para inovar e enterrar os traumas da heterodoxia. Criou a URV, unidade de conta para ser uma referência de como ficariam os preços quando se implementasse o real. A URV (Unidade Real de Valor) não era moeda. A moeda da época era o cruzeiro real. A URV atrelava-se ao dólar informalmente, embora oficialmente correspondesse ao conjunto de três índices de inflação.
A URV conviveu junto ao cruzeiro real (CR$), a moeda inflacionada e que não valia nada, por cinco meses, até a implantação do real (R$). Durante esses meses, os preços possuíam valor em cruzeiro real e em URV. A URV deu a transparência necessária para que se pudesse acompanhar a evolução virtual dos preços em real, quando este fosse oficializado.
A última cotação da URV correspondeu a CR$ 2.750,00, que representava a cotação de um dólar. Embora não se referisse diretamente ao câmbio, os agentes econômicos fugiam da moeda podre indo para outros ativos, como o dólar. Afinal, em processos hiperinflacionários, o dólar é a moeda corrente, é o ativo mais forte, o demandado, porque ninguém quer ficar com moeda que só perde poder de compra.
De julho de 1994 para cá, as políticas evoluíram, o país acostumou-se com inflação baixa e estável, e o mundo quer que o Brasil, nona potência econômica global e um dos maiores mercados consumidores, não apresente inflação alta nem perca esta condição, por causa do potencial de investimentos e das exportações de alimentos. O Brasil é foco de inversões estrangeiras e celeiro para alimentar as demais nações.
Nessa progressão, o sistema de metas inflacionárias foi adotado em 1999, o Banco Central ganhou autonomia em 2021 e, mais recentemente, para 2025 constituiu-se o sistema de metas inflacionárias na casa de 3,0% de forma contínua. Ou seja, o Banco Central só conduzirá as políticas de estabilização, porque a meta será de 3,0%.